terça-feira, 31 de julho de 2012

AMÉRICA INDÍGENA PRECURSORA DO MUNDO


Surpresa: práticas comunitárias dos povos pré-colombianos anteciparam atitudes de colaboração e compartilhamento que marcam a nascente cultura pós-capitalista
Por Bernardo Gutierrez | Tradução: Daniela Frabasile
A economia compartilhada está em alta. O croud sourcing (compartilhar um trabalho colaborativo com uma multidão que atua em rede) já é conhecido. O croud funding (financiamento coletivo) chegou com muita força em setores como a cultura. A sociedade P2P (peer-to-peer, de pessoa a pessoa) — mais horizontal, participativa e menos fixada em retribuições econômicas, como definem Yochai Benkler ou Michel Bauwens — ilumina o túnel, como uma das possíveis saídas pós-capitalistas. O commons – o bem comum e os bens coletivos – está em pauta. O co-working já não é tendência: é realidade. Infelizmente, há quem só acredite nessas novas práticas e realidades se um guru do Vale do Silício fala sobre elas. E se existe um termo em inglês…
Surpresa: se estudarmos as práticas da América pré-colombiana veremos que todos os indígenas praticavam o crowd fundingcrowd sourcing ou as dinâmicas participativas da era 2.0. A chegada dos povos africanos, com uma forte origem coletiva, também transformou a América (principalmente a latina) em um grande território do comum (commons territory, para aqueles que preferirem). A América pré-capitalista era chiccool e 2.0, não é mesmo? E ainda é. Os indígenas anteciparam-se em vários séculos no que diz respeito à chamada economia do compartilhamento (sharing economy). A mega crise mundial está pressionando a produção a uma mudança irreversível. E o pós-capitalismo tem algumas de suas raízes naquele pré-capitalismo da América indígena.
Nota aos incrédulos: preparei uma rápida revisão de alguns termos e práticas colaborativas dos povos indígenas da América Latina. Que cada um complete e atualize a lista como queira, porque sem dúvida é apenas uma aproximação.

Tequio. É uma forma de trabalho em prol do coletivo muito enraizado na cultura zapoteca. Os integrantes de uma comunidade fornecem material ou sua força de trabalho para realizar uma obra comunitária. Pode ser uma escola, um poço ou uma estrada. O indivíduo não pode ser nunca o único a ser beneficiado pelo tequio. Tem um toque de crowd sourcing, um pouco de crowd funding e muito de commons. O tequio ainda funciona em alguns estados mexicanos. Em Oaxaca, está protegido por uma lei estatal. Existem outros termos para práticas similares, como gozona e o trabalho a mano vuelta.
Potlatch. As tribos indígenas do Pacífico, nos Estados Unidos e Canadá, praticavam um ritual de troca que, na essência, é igual à troca de arquivos peer-to-peer da era digital. O potlatch, usado pelos povos HaidaTlingitTsimshian, SalishNuu-chah-nulth, e Kwakiutl, é o peer-to-peer em estado puro. O potlatch não era um escambo. Os povos distribuíam alimentos (principalmente carne de foca e salmão) e riqueza para outras tribos que não tinham vivido um bom ano. Um detalhe importante: alguns colonizadores europeus enriqueceram-se graças ao potlatch. Exatamente como os cantores famosos que, segundo estudos, beneficiam-se da troca de arquivos entre usuários — que alguns empenham-se em chamar de pirataria…
Guelaquetza. A tradição de guelaguetza, do estado mexicano de Oaxaca, lembra uma mescla do tequio e do potlatch. A palavra significa “troca recíproca de presentes e serviços”. Sua prática se tece entre as relações recíprocas que unem as pessoas. É a base de uma rede de cooperação entre famílias e até entre povos e municípios. A guelaguetza deriva também de uma celebração sincrética que acontece na cidade de Oaxaca.
Minga. É um termo quechua que define um mecanismo ancestral de trabalho coletivo, muito comum no norte do Peru e no Equador. O objetivo da comunidade está acima de qualquer benefício individual. A colaboração, acima da competição. É 100% commons economy + crowd sourcing. Não é coincidência que a Cultura Senda, que trabalha com a cultura de rede, tenha realizado recentemente, em Quito, um seminário chamado Open Minga. A minga, segundo o texto da Cultura Senda, “implica no desafio de superar egoísmos, protagonismos, desconfianças, preconceitos e inveja; males que muitas vezes espreitam o trabalho coletivo e a mobilização social”. Além disso, “implica em aprender a escutar e obedecer propondo”.
Ayni. Trata-se de algo com significado muito próximo da minga, que define um sistema de trabalho de reciprocidade familiar entre os membros da ayllu (uma comunidade que trabalha com a propriedade coletiva). O mais comum é trocar trabalhos na agricultura, pastoreio, cozinha ou na construção de casas. Essa tradição continua viva não apenas em muitas comunidades camponesas, mas também na população mestiça no Equador, Bolívia, Peru e Chile. Os bancos de tempo, para troca de serviços no movimento espanhol 15-M por exemplo, têm muito de ayni.
Mutirão. É um termo de origem tupi, usado no Brasil para definir uma mobilização coletiva baseada na ajuda mútua não remunerada. A definição de mutirão na Wikipedia é bastante redonda: “uma expressão usada originalmente para o trabalho no campo e na construção civil de casas populares, em que todos são beneficiários e se ajudam, com um sistema rotativo e sem hierarquia”. É muito usado para ações coletivas não remuneradas como limpeza de parques, ruas , escolas… Para esta prática de ação comunitária existem muitos sinônimos: muxirão, muxirã, muquirão, putirão, putirum, pixurum, ponxirão, punxirão ou puxirum.
Córima. O povo mexicano rarámuri, que vive nas montanhas de Chihuahua, usa o termo córima para definir um ato de solidariedade com alguém que está passando mal. Não oferecer córima a alguém que precisa de ajuda é considerado uma violação de uma obrigação e uma ofensa. A definição também inclui a “prática do bem comum”. Não é muito relacionada à caridade, já que os rarámuri estão longe damoral católica. A máxima autoridade das decisões desse povo é a assembleia, como nos movimentos como 15M, Occupy Wall Street e o mexicano #YoSoy32.
Maloca. É uma casa comunitária utilizada pelas tribos indígenas da região amazônica do Brasil e da Colômbia. Nela, diferentes famílias convivem, Compartilham o lugar de trabalho, da mesma forma que os espaços de co-working. A propriedade é coletiva, como as ocupações (squatter communities) na Europa. O commons dita o dia a dia. De noite, a maloca é um centro de conhecimento. Contam histórias, mitos, lendas. As tendas da campanha da praça Tahir, no Cairo; na Puerta del Sol, de Madri; ou de Zuccotti Park, em Nova York, durante o Occupy Wall Street, poderiam ser a versão tecno dessas casas coletivas na Amazônia.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

RELATOS DE GUERNICA, 75 ANOS DEPOIS


Na cidade espanhola bombardeada por Hitler e Mussolini, um sobrevivente narra as horas da destruição — e fala sobre projeto para converter uma antiga fábrica de armas  em centro cultural
Por Amy Goodman, no Diário da Liberdade
Há 75 anos, a cidade basca de Guernica foi bombardeada e ficou reduzida a escombros. Esse ato brutal inspirou a um dos maiores artistas do mundo a realizar uma pintura para a qual dedicou três semanas de trabalho frenético. Em um óleo de 3,50X7,80 metros, “Guernica”, de Pablo Picasso, mostra de maneira crua os horrores da guerra, refletidos nos rostos das pessoas e dos animais. Não foi o pior ataque da Guerra Civil Espanhola; porém, converteu-se no mais famoso graças ao poder da arte. O impacto de milhares de bombas lançadas sobre Guernica, do fogo das metralhadoras disparadas das aeronaves contra os civis que tentavam fugir do inferno podem ser sentidos até hoje através dos sobreviventes que partilham com entusiasmo suas recordações e também nos jovens de Guernica, que lutam para forjar um futuro para sua cidade, algo distante de sua dolorosa história.
A Legião Condor da Luftwaffe (a Força Aérea Alemã durante a Alemanha nazista) realizou o bombardeio a pedido do General Francisco Franco, que encabeçava uma rebelião militar contra o governo democraticamente eleito da Espanha. Franco procurou a ajuda de Adolf Hitler e de Benito Mussolini, que estavam muito entusiasmados em pôr em prática as modernas técnicas de guerra contra os indefesos cidadãos espanhóis. O ataque contra Guernica foi a primeira vez na história europeia que uma cidade civil foi completamente destruída por um bombardeio aéreo. Apesar de que as casas e as lojas foram destruídas, várias fábricas de armas, uma ponte de importância-chave e as linhas férreas ficaram intactas.
Ativo e lúcido aos 89 anos de idade, Luis Iriondo Aurtenetxea sentou-se junto a mim no escritório da organização Gernika Gogoratuz, que, em basco, significa “Recordar a Guernica”. O basco é um idioma antigo e um elemento fundamental da férrea independência do povo basco, que vive há milhares de anos na região fronteiriça entre a Espanha e a França.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

FILE EM SÃO PAULO.


FILE SP 2012 começa em São Paulo


Teve início, nesta semana, a 13ª edição do maior encontro de arte digital do Brasil, oFestival Internacional de Linguagem Eletrônica – FILE SP 2012. Realizado na Galeria de Arte do SESI-SP, no Centro Cultural FIESP – Ruth Cardoso, o festival acontece até 19 de agosto.
O FILE SP 2012 conta com instalações interativas, games, workshops, animações, música eletrônica e maquinemas (filmes construídos em realidade virtual).
A edição deste ano do festival de animação, FILE Anima+, será apresentada na Galeria de Arte e no Teatro do SESI-SP, no Espaço FIESP, no Museu da Imagem e do Som (MIS) e também em estações do metrô ao longo da Av. Paulista. O festival conta com trabalhos provenientes de parcerias com os maiores festivais de animação do mundo.
Instalação What a Loving, and Beautiful World, do grupo Sisyu+teamLab (Divulgação)
Entre os dias 17 e 20 de julho, o Teatro do SESI-SP recebe as apresentações do Hipersônica Performance, assim como a exibição de animações. Também nesta primeira semana, o FILE SP 2012 traz as programações do FILE Workshop e Symposium, que acontecem na Sala de Ensaio e no Mezanino do SESI-SP.

domingo, 15 de julho de 2012

CRITICA DE GISELLE DO SCALA DE MILÃO



Crítica: Scala de Milão traz elenco afinado em montagem de "Giselle"


Como uma companhia de dança tradicional, em que o repertório clássico ainda é o carro-chefe --embora também se permita a experimentações modernas--, o Teatro Scala de Milão cumpre com dignidade a missão de perpetuar o balé.


Em sua terceira passagem pelo Brasil, o grupo dirigido pelo russo Makhar Vaziev (ex-diretor e ex-primeiro bailarino do Kirov Ballet) apresentou "Giselle", o grande clássico da era romântica.


Em São Paulo, a companhia foi acompanhada pela Orquestra Sinfônica de Barra Mansa, sob regência do maestro italiano Alessandro Ferrari. Na estreia paulistana, no Theatro Municipal, a dupla de protagonistas Petra Conti (Giselle) e Eris Nezha (Albrecht) mostrou-se afinada com a leveza solicitada pelos personagens, principalmente no segundo ato, mais dramático e complexo em termos técnicos da dança.


"Giselle" é o tipo de história de amor sem final feliz, o que talvez contribua para que seja ainda mais admirada. A camponesa que vive com a mãe em uma pequena aldeia se apaixona por um lenhador.


Na verdade, ele era um lorde disfarçado para ficar próximo de Giselle, que descobre toda a farsa e também o fato de ele já ser comprometido. Muito triste, ela passa a ter devaneios de loucura, se fere com uma espada e morre.


O segundo ato é marcado pelo plano das sombras, onde reinam as donzelas Willys, que morreram antes do casamento e rondam os campos para fazer suas vítimas dançarem até a morte.


Giselle junta-se a esse grupo, aparece para seu amado, mas consegue salvá-lo da morte. Esta segunda parte do espetáculo compensa a fragilidade da primeira, em que o excesso de mise-en-scène o torna às vezes infantil.


Em cena, as Willys da companhia italiana entram afinadíssimas, com movimentos precisos e pernas elevadas na mesma altura, o que denota um corpo de baile em sintonia. Os braços e petinés (pequeno passo em que os pés ficam próximos e se movimentam rapidamente) são visivelmente bem estudados para alcançar a delicadeza.


Aliás, por necessitar de movimentos de extrema precisão, além de força, agilidade e outras inúmeras habilidades dos bailarinos, o balé clássico ganha em virtuosismo quando estes parecem estar fazendo pouco esforço, como é o caso do elenco do Scala. Com alguns, mas poucos erros nas principais variações, eles saltam, giram e se movimentam com desenvoltura, fazendo tudo parecer simples.


Os cenários e figurinos criados por Aleksandr Benois e reelaborados por Angelo Sala e Cinzia Rosselli contribuem para a magia do espetáculo, em que se destaca novamente o segundo ato, com suas árvores retorcidas e o tom soturno na medida certa.


Após passagem por Goiânia e Belo Horizonte, a companhia passa pelo Rio de Janeiro, de 18 a 22 de julho, no Theatro Municipal.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

CRÍTICA DA ÓPERA "RIGOLETTO" DE VERDI - TEMPORADA 2012 THEATRO MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO


       UM RIGOLETTO COM POUCO BRILHO

                         Vicente de Percia

   Aberta a temporada de ópera de 2012 do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. O público compareceu em massa, esperançoso em assistir um bom espetáculo, visto que as últimas montagens ressaltando alguns interpretes e vozes como a da soprano argentina Paula Almenares em Lucia di Lammeermor de Donizetti. Infelizmente “ Ricoletto” estava muito aquém dos espetáculos operísticos já apresentados nesse Theatro, incluindo a obra em foco.

   Verdi sempre exige sempre boas vozes e timbres específicos e “ Rigoletto” não foge a regra. Ópera em três atos, libreto de Francesco Naria Piave alicerçado em “Le Rois s’ Amuse de Victor Hugo. Estreia no Teatro de La Fenice , Veneza em 11 de Março de 1853. As informações é que ela foi composta em apenas 40 dias em plena jovialidade de Giuseppe Verdi(1813/1901).

   O Bufão (Rigoletto) é personagem centralizador dessa ópera o que não coloca em segundo plano os demais personagens. O barítono italiano Roberto Frontali apesar de ter uma boa voz não convenceu no papel principal, faltou- lhe presença, dramaturgia, enfim suporte para impor o grande canalha e sua complexidade.
Fernando Portari surpreendeu, porém não imprimiu a altivez, o domínio e a destreza necessária ao Duque de Mântua. Em  La Donna e móbile” no terceiro  ato na estreia não foi convincente. Ficou um querer mais.
Artemisa Repa ( Gilda) excelente postura dramática, bela voz. Faltou um entrosamento maior com a personalidade da personagem.
Nessa montagem o cenário não passou de razoável e a decisão de jogar imagens no cenário foi desastrosa e o ambiente escuro em nada contribuiu para o drama. Sem dúvida apesar de não ser o desejado melhor que os chamados “cenários contemporâneos”.
A direção musical do maestro Oswaldo Ferreira Tudo não foi feliz, a obra estava solta sem vigor de uma história que requer o domínio do drama.