domingo, 28 de fevereiro de 2010

POP ART - ROBERT RAUSCHENBERG


Pergunte ao grande público qual o primeiro nome que vem à mente quando se fala em arte pop e Andy Warhol (1928-1987), certamente, será o mais lembrado. Pergunte aos próprios artistas pop quem era o seu papa e o nome que vai surgir é outro: o do americano Robert Rauschenberg (1925-2008), tema de uma bela exposição que abre neste mês no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo. Jasper Johns, conhecido por ter transformado em arte a imagem da bandeira dos Estados Unidos, aponta Rauschenberg como o mais criativo dos artistas americanos de sua geração. Willem De Kooning (1904-1997), durante muito tempo o pop mais cultuado pelos artistas jovens, foi mais longe ainda em sua homenagem a Rauschenberg. Autorizou o artista a apagar um de seus desenhos, no que seria um gesto artístico. Erased De Kooning Drawing (Desenho de De Kooning Apagado), de 1953, virou referência nos anos 50.
E o que faz de Rauschenberg um artista cultuado por seus pares? Ele é um dos pioneiros em pelo menos três procedimentos definidores da arte pop: o uso do dia a dia como matéria-prima, a referência a imagens produzidas em larga escala pela indústria cultural e a incorporação da palavra ao repertório das artes plásticas (veja obras ao longo desta reportagem). Essas posturas estão na mostra em São Paulo, que reúne 99 peças realizadas em sua trajetória: 76 delas gravuras e o restante assemblages (colagens feitas com os mais variados materiais). Rauschenberg fez também pinturas, fotografias e performances, sem necessariamente respeitar as fronteiras entre cada uma das técnicas.
Pode-se dizer que o artista foi radical ainda por seguir, de maneira bastante pessoal, os ensinamentos de um antecessor ilustre. "Ele é tão importante para a arte contemporânea por ter levado às últimas consequências as experimentações de Marcel Duchamp (1887-1968), o precursor do dadaísmo", diz o crítico e curador Nelson Aguilar. "Duchamp era um fidalgo, tinha um certo ar aristocrático. Rauschenberg, não. Era do povo e, por isso, conseguiu dar ao lixo o status de arte", completa Aguilar - que, em 1994, organizou uma sala para o artista pop, durante a 22ª Bienal de São Paulo. Ele se refere ao fato de o texano tomar como matéria-prima materiais descartados pela sociedade, incluindo embalagens de produtos e pneus velhos. "De certa forma, Rauschenberg torna viável o que Duchamp elaborou. John Cage, Merce Cunningham e Jasper Johns viraram outros artistas depois que o conheceram."
Criador de vanguarda, Rauschenberg foi um dos primeiros a explorar a ideia de que arte e vida não deveriam andar tão separadas. Suas combine paintings (algo como "pinturas combinadas"), como chamou os trabalhos, usavam toda a sorte de produtos encontrados por ele ao acaso, de garrafas de Coca-Cola a pássaros empalhados. A partir de 1962, ele explorou ainda a técnica de serigrafia para imprimir fotos em grandes telas. Em 1964, depois de ganhar o prêmio de pintura da Bienal de Veneza, Rauschenberg já era um nome consagrado nas mais fechadas rodas internacionais.
O artista adorava o Brasil, país que visitou muitas vezes. Além da edição de 1994 da Bienal, com curadoria de Aguilar, ele havia estado por aqui nas edições de 1959 e 1967, e posteriormente ainda teve peças exibidas na 24ª edição do evento, em 1998. "Ele sempre foi grato à projeção internacional que ganhou aqui. Estava comandando toda a idealização dessa mostra, viria para cá, mas acabou morrendo antes", conta o diretor do Instituto Tomie Ohtake, Ricardo Ohtake, que prepara a individual desde 2007. Mesmo com a participação destacada de Rauschenberg em bienais, esta é provavelmente sua mostra mais importante no país.
Mario Gioia é jornalista e crítico de arte.