Nos EUA, fundações e think-tanks conservadores recompensam, quase 1 bilhão de dólares ao ano, teóricos que negam mudanças climáticas
A investigação do sociólogo norte-americano Robert Brulle, citada há dias no Le Monde, foi publicada na última edição da revista Climatic Change. Brulle tem estudado a fundo o que chama de “contramovimento sobre as alterações climáticas” nas últimas décadas e identificou 91 organizações com intervenção sistemática no espaço público no sentido de promover o ceticismo sobre as alterações climáticas e impedir mudanças políticas que as combatam.
Entre 2003 e 2010, este investigador calcula que tenham sido injetados 900 milhões de dólares todos os anos por parte de 140 fundações filantrópicas conservadoras, incluindo muitas pertencentes às grandes famílias da indústria do petróleo, minas e do setor financeiro. Em primeiro plano, pelo menos até 2007, estavam as Fundações Koch e ExxonMobil.Mas a partir daí as contribuições públicas destas organizações encontram-se dissimuladas no Donors Trust e Donors Capital, duas entidades com a mesma morada que passaram a agrupar os donativos daquelas fundações para os redistribuir depois sem a mesma transparência. Do ponto de vista dos investigadores, estas duas entidades “são uma caixa negra” envolta em secretismo, mas Brulle calcula que representava em 2003 cerca de 3% do total de doações a este contramovimento, disparando em 2009 para cerca de 25% do total.
“Este é um movimento político muito bem organizado que abarca diversas componentes, sem grande coordenação mas seguindo a mesma linha. Vemos organizações que se concentram no desenvolvimento de ideias, como os think tanks, grupos de media, publicidade, actividades educativas nas universidades”, explicou Robert Brulle em entrevista à estação pública norteamericana PBS.
Brulle situa este contramovimento na órbita do movimento conservador, ao qual se associou no fim dos anos 80 para se tornar num dos seus grandes temas já neste século.
Para Brulle, assistimos à combinação das fundações filantrópicas da indústria e dos conservadores. “O que eles fizeram foi tomar emprestadas muitas das estratégias e táticas usadas pela indústria tabaqueira para impedir a ação sobre os efeitos do tabagismo para a saúde”, acrescenta o sociólogo da Drexel University de Filadélfia. “Eles usam as mesmas organizações e as mesmas táticas para semear dúvidas sobre se as alterações climáticas serão um problema ambiental sério e verdadeiro”, tal como antes fizeram acerca da ligação entre o tabagismo e o cancro.
“Este movimento teve um verdadeiro impacto político e ecológico no fracasso da ação mundial nesta área. Não creio que tenha sido a única causa que nos impediu de agir, mas julgo que tem sido uma causa importante do atraso das ações para combater as alterações climáticas”, prossegue Robert Brulle.
Este estudo de Robert Brulle é a primeira de três partes de um trabalho mais ambicioso. O sociólogo quer estudar também o financiamento das organizações ecologistas e a seguir fazer a comparação entre os dois movimentos. Para já, Brulle diz que embora o movimento ecologista tenha uma capacidade maior de recolha de fundos do que os céticos das elterações climáticas, a diferença está na forma como gasta esse dinheiro.
Os ambientalistas “procuram gastar o dinheiro no desenvolvimento de soluções para as alterações climáticas, como apoiar a indústria de painéis solares na China, assegurar que toda a gente tem um forno solar na India para reduzir as emissões de CO2, e outras coisas do mesmo género. Raramente gastam dinheiro em processos políticos ou culturais”, que é o grande alvo das despesas do contramovimento dos céticos do clima,ou seja, a grande diferença encontrada por Brulle é que “enquanto um movimento realmente tenta desenvolver soluções tecnológicas no terreno, o outro está empenhado na ação política para atrasar qualquer tipo de ação…”.
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