“O Correio”, Rio de Janeiro, ano VI, nº 146, 2002
A
Arte Entre o Real e a Ficção.
Vicente de Percia
Nos anos 6o, artistas insistiram em utilizar-se de imagens,
ready made, tentando conseguir espaços respeitável no circuito das artes.Era
uma fixação onde o discurso falado predominava sobre o visual.De certo modo,
deixava-se de lado a criação do domínio do conhecimento técnico e as tendências
onde o suporte dessa postura estava em alegar que a pintura morrera,assim como
os atelieres tradicionais,gravuras,desenhos etc...
Neste período, paralelo ao “novo discurso” pouco visual,
surgiram criações voltadas para a Pop Art e europeias ligadas ao Novo Realismo.
No Brasil, a produção artística se distanciava, em parte, das teorias
americanas e do velho mundo que exerciam influência mundial com a Pop Art. As
criações brasileiras acoplavam concepções com a arte popular e a história
brasileira.
A brasilidade afastava a ironia e o cool que os artistas
Liechtenstein e Warhol davam as suas obras. No geral, percebiam-se influências
da nova onda nas artes plásticas nacionais. As regras estéticas de imagens de
fora escondiam-se no termo abusivamente usado de “universalismo” e preenchiam
os catálogos das exposições,principalmente,no eixo Rio/São Paulo.
Em meados dos anos 70, o crítico do Correio Brasiliense,
Hugo Auler, elogiava o artista plástico Vicente Souza, cuja paixão era absorver
a cana de açúcar. Destacava-o imprescindível naqueles instantes conflitos
políticos sociais. O mesmo ocorria com o renomado artista Rubem Valentim num
texto de apresentação na Oscar Seraphico Galeria de Arte em Brasília: “No
momento em que a arte brasileira surge viva e polêmica com os equívocos
inevitáveis de falsos e habilidosos buscadores de “raízes”, é com satisfação
que vejo na pintura de Vicente de Souza, uma esperança de autenticidade. Sua
seriedade, experiência e acúmulo de informações darão sua dimensão própria para
no futuro que acredito seja, juntamente com outros com as mesmas motivações à
conquista de uma imagem que caracteriza o Sentir Mestiço do povo brasileiro”.
A década de 70 solidificou um diálogo entre a ficção dos
valores estéticos formais – cores, volumes, o transito entre o figurativo,
abstrato e o geométrico. – e uma realidade voltada para as culturas da
terra brasilis. Aliado a Vicente de Souza (canacultura),
paralelamente se destacavam: Antônio Henrique do Amaral
(bananacultura),Humberto Espíndola(bovinocultura).Outro artista entre o seu
mundo repleto de particularidades e de Metáforas brasileiras é
Farnese de Andrade.suas criações juntam “coisas” repletas de emoções e
peculiaridades concretas significativas.
A arte integrada a aspectos econômicos brasileiros foi um
dos enfoques na obra de Vicente de Souza, artista plástico do Amapá,
residente em Brasília e No Rio de Janeiro,onde foi assassinado em 1986 no
bairro da Tijuca.Prêmio de Viagem de Viagem do Salão Nacional de Arte
Moderna e participante da bienal de São Paulo,entre outras presenças
marcantes no Circuito da Arte,seu núcleo temático é a cana de açúcar em figurações
que extrapolam os limites agrícolas e adentram –se em nossa realidade
social.
Já que, desde o Brasil Colônia, a cana de açúcar tem relevo
na economia nacional ,a canacultura de Vicente de Souza vevencia a nossa
Historia.Traz para a tela o olhar arguto sobre cenas que,para muitos,seriam
indicações fugitivas.Seu traço junta qualidade de sentido,gerando um tipo de
magia poética que fluí,de seu ar mestiço, bem brasileiro.
O processo econômico e agrícola da cana é por ele observado
desde a semeadura, passando pelo surgimento dos colmos das flores em pendões
terminais até a colheita e a industrialização, incluindo aí os derivados.
Quando menino ele admirava os trabalhadores e professores, foi enviado pelo
governo de seu estado para estudar na Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro.
Com o aparecimento de novos elementos, vindos da
monocultura, moveu-se com desembaraço em nossas raízes, sem se tornar
retórico.Há uma maneira muito sua de ordenar as formas da cana com traços
expressivos ou pele têmpera,que acentua valores de textura,de sensibilidade dos
gestos.Optando por um jogo de possibilidades,Vicente de Souza atinge um humor
crítico,mexendo com problemas sociais.
Pertencente ao ciclo social das artes plásticas impôs um
pensamento político aos anos 70. Em suas telas, a cana de açúcar e seus
desdobramentos transfiguram reflexões bem brasileiras, em meio a diversas
formas estéticas de expressão.
Vicente de Souza – Memória – O Ciclo Social e a Canacultura
Nada mais coerente que o tempo para assimilar a produção
artística. Legitimar do ponto de vista crítico de imediato é correr risco,
principalmente no circuito das artes plásticas. Os apelos constantes do novo
causam equívocos e com eles danos difíceis de serem corrigidos.
O indivíduo saturado de informações precisa repensar para
não ser direcionado por uma dinâmica que pode levá-lo a desmobilização
envolvendo-o num clip de ritmo e pensamentos apressados.
Por outro lado podemos dispor de dados para avaliar períodos
no tocante a essa aceleração, coletando informações precisas e com isto
trazendo à tona conceitos e diferenças contidas na própria história.
Hoje é possível afirmar o posicionamento contrário da Art
Pop em função do subjetivismo e hermetismo moderno; a contra partida em
denunciar nas artes, a vida farta de signos estéticos e massificados.
Dando ênfase à reflexão através de ciclos, assistimos que
para alguns estudiosos o pós-moderno aparece quando a bomba
atômica é lançada em Hiroschima durante a II Guerra Mundial em agosto de 1945.
Outros atribuem seu nascimento a partir do termo usado pelo historiador Toynbee
por volta de 1947.
Foto: Obra do artista Vicente de Souza - técnica: tela, tinta acrílica., título: " Interferências 1986. Prêmio de viagem do Salão Nacional de Arte Moderna.