Noite de estreia mundial da ópera "Piedade" em quatro cenas de
João Guilherme Ripper( música e libreto) no Viva Rio no Rio de Janeiro,
21/04/2012.O tema é a relação de Dilermando de Assis com Anna da
Cunha esposa do escritor Euclides da Cunha, autor de "Os Sertões"
(1902) culminando com a morte de Euclides assassinado por Dilermano no bairro da piedade no Rio de Janeiro. Segundo
o compositor e autor do libreto "a ópera não se dispõe a apresentar um
exato documentário sobre o fato e sim uma produção artística na qual
música e poesia se conduzem os episódios mais relevantes até sua pesarosa
conclusão." Vale lembrar que a lembrança desse drama é constante na
história do Brasil, fruto de pesquisas, controvérsias e polêmicas.
Recentemente, a historiadora Mary del Priore publicou o primoroso e
elucidativo livro " Matar Para Não Morrer", best best-seller que aborda
essa tragédia, editora objetiva,Rio, Rj, 2009.
O espaço não adequado do "Viva Rio",improvisado mediante à interdição do Thetro Municipal do Rio de Janeiro e a encenação desprovida de
cenário( uma cama, totalmente desnecessária), tendo como suporte só o figurino, sem dúvida foi
extremamente prejudicial ao espetáculo. No Elenco Paula Almenares, soprano
argentina(Anna Cunha)foi a grande referência do espetáculo.Presença
solicitada nos mais respeitáveis teatros líricos, Almenares cativou pelo seu
timbre, volume, interpretação e dicção perfeita da língua
portuguesa(dialeto brasileiro). Seu personagem, Anna, foi o destaque na
ópera " Piedade" coube a bela soprano no último ato exibir seus
predicados como diva : marcante, fluiu com um tour de coloraturas e dramaticidade impares,
aliais nessa récita somente foi perceptível e comovente as suas árias, as
demais se perderam,inclusive os duetos. A soprano argentina foi, também o
destaque em "Lúcia di Lammermoor", Donizetti, em
2011 no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. O público operístico
torce por tê-la sempre atuando no Brasil. Homero Velho, barítono brasileiro,
desenvolveu seu personagem (Euclides da Cunha) com clareza, impondo a sua voz
timbres claros sem dificuldades nas notas mais graves, à principio as mais
desafiadoras notas, principalmente em relação a língua portuguesa dotada
de vocábulos tônicos. O Tenor Marcos Paulo, não foi feliz nessa récita, sua voz
com pouco volume e um timbre limitado no cromatismo, sua atuação como o
jovem e apaixonado. O dueto onde Euclides e Dilermando se encontram pela primeira vez não atinge o ápice em mostrar o escritor e o defensor das nossas fronteiras,homem amadurecido com o jovem militar.Dilermando não convenceu. Na ária de amor para Anna em meio aos confrontos da paixão não acompanhou o clímax da trama. A ausência do coro em
"Piedade" fez falta, pois é um instrumento de apoio, fundamental para
reiterar e dar ênfase à história e permitir maior aproximação com o público em
relação ao tempo, os estágios e a atmosfera da ópera. O fato de
"Piedade" ter somente três personagens tornam as sequências rápidas, foi assim nessa montagem, mesmo com a intervenção do violão que tende a ser entremeio e até o prelúdio, porém não fez o elo
desejado à continuidade da ópera. Paulo Pedrossoli Jr (violão)
foi perfeito e a música é pertinente com a proposta do compositor, adota o
lirismo e a poesia literária(legendada) no percurso da ópera. A regência de
Isaac Karabtchevsky foi perfeita e a Orquestra Petrobras Sinfônica correspondeu com
mestria sua perfomace. A obra de Ripper, musicalmente é bem
realizada, aponta um tratamento contínuo musical que não se perde. É sintético
e analítico em mostrar um tonalismo condizente com a sua proposta, escapa,
contudo um realismos mais condizente com a história dos amantes. Aguardamos
vê-la montada adequadamente.
Vicente de Percia
Member da Associação brasileira e internacional de críticos de arte e da Bow Art international